sexta-feira, 18 de fevereiro de 2011

A nossa opinião (teoria), e a verdade (leis ou paradigmas) por António da Costa Oliveira.


Temos de nos entender. Estou farto de ouvir dizer; escusas de me tentar dizer o contrário porque eu vou ficar na minha. Não há nada que esteja mais em voga do que a opinião de cada um sobre seja o que seja..
Em termos científificos há, por exemplo as teorias do desenvolvimento da espécie humana. Há pequenos factos que vão surgindo para sustentar essas teorias, mas elas ainda não se tornaram leis universais científicas, porque carecem de muitos mais factos e muito mais informação. Isto são teorias.
Por outro lado, há leis científicas comprovadas. Obedecem a métodos rigorosos de análise e tratamento de dados e informação. São verdades ou os chamados paradigmas.
Nada disto é imutável ou inalterável.
Eu só gostava que tentassem perceber a diferença e não achassem que a vossa opinião pode valer nos dois casos.
Uma teoria será sempre uma teoria, capaz de suscitar opiniões diversas. Uma lei científica ou  paradigma, permanece inalterável e não se modifica segundo a nossa vontade, mas quando surja outra que a anule.
   
Comecem a seleccionar os temas em que podem ter opinião porque é feio parecer-se ridículo...
António da Costa Oliveira
18-02-2011 

quinta-feira, 17 de fevereiro de 2011

quarta-feira, 29 de dezembro de 2010

segunda-feira, 22 de novembro de 2010

quinta-feira, 11 de novembro de 2010

A Virtude Pura não Existe nos Dias de Hoje

Numa época tão doente como esta, quem se ufana de aplicar ao serviço da sociedade uma virtude genuína e pura, ou não sabe o que ela é, já que as opiniões se corrompem com os costumes (de facto, ouvi-os retratarem-na, ouvi a maior parte glorificar-se do seu comportamento e formular as suas regras: em vez de retratarem a virtude, retratam a pura injustiça e o vício, e apresentam-na assim falsificada para educação dos príncipes), ou, se o sabe, ufana-se erradamente e, diga o que disser, faz mil coisas que a sua consciência reprova. 

(...) Em tal aperto, a mais honrosa marca de bondade consiste em reconhecer o erro próprio e o alheio, empregar todas as forças a resistir e a obstar à inclinação para o mal, seguir contra a corrente dessa tendência, esperar e desejar que as coisas melhorem. 
Michel de Montaigne, in 'Ensaios - Da Vaidade'

Ruggero Raimondi - Te Deum dalla Tosca di Puccini (Finale atto I) - Aren...

Exodus Soundtrack - Ernest Gold

quarta-feira, 20 de outubro de 2010

Barrow-on-Furness



I

Sou vil, sou reles, como toda a gente
Não tenho ideais, mas não os tem ninguém.
Quem diz que os tem é como eu, mas mente.
Quem diz que busca é porque não os tem.

É com a imaginação que eu amo o bem.
Meu baixo ser porém não mo consente.
Passo, fantasma do meu ser presente,
Ébrio, por intervalos, de um Além.

Como todos não creio no que creio.
Talvez possa morrer por esse ideal.
Mas, enquanto não morro, falo e leio.

Justificar-me? Sou quem todos são...
Modificar-me? Para meu igual?...
— Acaba já com isso, ó coração!

II

Deuses, forças, almas de ciência ou fé,
Eh! Tanta explicação que nada explica!
Estou sentado no cais, numa barrica,
E não compreendo mais do que de pé.

Por que o havia de compreender?
Pois sim, mas também por que o não havia?
Água do rio, correndo suja e fria,
Eu passo como tu, sem mais valer...

Ó universo, novelo emaranhado,
Que paciência de dedos de quem pensa
Em outras cousa te põe separado?

Deixa de ser novelo o que nos fica...
A que brincar? Ao amor?, à indif'rença?
Por mim, só me levanto da barrica.

III

Corre, raio de rio, e leva ao mar
A minha indiferença subjetiva!
Qual "leva ao mar"! Tua presença esquiva
Que tem comigo e com o meu pensar?

Lesma de sorte! Vivo a cavalgar
A sombra de um jumento. A vida viva
Vive a dar nomes ao que não se ativa,
Morre a pôr etiquetas ao grande ar...

Escancarado Furness, mais três dias
Te aturarei, pobre engenheiro preso
A sucessibilíssimas vistorias...

Depois, ir-me-ei embora, eu e o desprezo
(E tu irás do mesmo modo que ias),
Qualquer, na gare, de cigarro aceso...

IV

Conclusão a sucata!... Fiz o cálculo,
Saiu-me certo, fui elogiado...
Meu coração é um enorme estrado
Onde se expõe um pequeno animálculo...

A, microscópio de desilusões
Findei, prolixo nas minúcias fúteis...
Minhas conclusões práticas, inúteis...
Minhas conclusões teóricas, confusões...

Que teorias há para quem sente
O cérebro quebrar-se, como um dente
Dum pente de mendigo que emigrou?

Fecho o caderno dos apontamentos
E faço riscos moles e cinzentos
Nas costas do envelope do que sou...

V

Há quanto tempo, Portugal, há quanto
Vivemos separados! Ah, mas a alma,
Esta alma incerta, nunca forte ou calma,
Não se distrai de ti, nem bem nem tanto.

Sonho, histérico oculto, um vão recanto...
O rio Furness, que é o que aqui banha,
Só ironicamente me acompanha,
Que estou parado e ele correndo tanto...

Tanto? Sim, tanto relativamente...
Arre, acabemos com as distinções,
As subtilezas, o interstício, o entre,
A metafísica das sensações —

Acabemos com isto e tudo mais...
Ah, que ânsia humana de ser rio ou cais!

Álvaro de Campos, in "Poemas"
Heterónimo de Fernando Pessoa

Ray Charles - You don't know me (live)

Jerry Goldsmith - Looney Tunes - Back In Action - Suite #1

segunda-feira, 18 de outubro de 2010

Andrea Dieci (guitar) plays Capricho Catalan by Albeniz

Erie Saxophone Quartet - Philip Glass Concerto for Saxophone Quartet I.

Algo que, realmente, surpreende

Gostar de música está na moda. Gostar de boa música ainda mais. Há um medo muito grande de se gostar de música que não tenha qualidade. Pode parecer mal e não ficar nada bem. É assustador poder pensar que se pode gostar de uma canção do Tony Carreira ou do Quim Barreiros e do Emanuel nem pensar. É pimba. Temos de ter muito cuidado com a música pimba.
Afinal, que fenómeno é este da música pimba? Muita gente já tentou estabelecer a fronteira entre a música pimba e a outra. E a outra qual é? Só porque se canta noutra língua já não é pimba? Quanto menos percebem de música mais selectivos tentam ser os pseudo-entendedores deste fenómeno musical. Baralham-se, baralham os outros, misturam tudo e fazem uma confusão tremenda. Quem não se preocupa com isto, convive de uma forma sã e espontânea com a música e tira disso muito proveito.
Há algum tempo que todo o tipo de música passou a ser designado de Música do Mundo - seja ela pimba, fado, clássica, ópera, barroca, samba, jazz, blues, etc. Perdeu os apelidos tradicionais. Vão-se habituando a isto e passem palavra.
Poderia tentar traçar a tal fronteira entre a música popular e a música pimba, mas, sinceramente, não acredito que ela exista.
Há, realmente, música de péssima qualidade, mas essa até as crianças conseguem identificar.

António da Costa oliveira 17-10-201

domingo, 10 de outubro de 2010

Raaf Hekkema Saxophone Paganini Caprice No 24

Bom humor

O «Ensina-me»

Quando era novo, mandei fazer numa tábua 
A canivete e nanquim a figura dum velho 
A coçar-se no peito por causa da sarna 
Mas de olhar implorativo porque esperava que o ensinassem. 
Uma segunda tábua pra o outro canto do quarto, 
Que devia representar um moço a ensiná-lo, 
Nunca mais foi feita. 

Quando era novo tinha a esperança 
De encontrar um velho que se deixasse ensinar. 
Quando for velho, espero 
Que se encontre um moço e eu 
Me deixe ensinar. 

Bertold Brecht, in 'Lendas, Parábolas, Crónicas, Sátiras e outros Poemas' 
Tradução de Paulo Quintela

O Grande Educador


É além de tudo essencial que a escola se não separe do mundo; não há escolas e oficinas; há um certo género de oficinas em que trabalham crianças nas tarefas que lhes são adequadas e lhes vão facilitando o desenvolvimento do corpo e do espírito; vão colaborando no que podem e no que sabem para que a vida melhore. Ninguém fugirá da escola e a olhará como um horror no dia em que a deixemos de conceber como o lugar a que se vai para receber uma lição, para a considerarmos como o ponto de condições óptimas para que uma criança efectivamente dê a sua ajuda a todos os que estão procurando libertar a condição humana do que nela há de primitivo; não se veja no aluno o ser inferior e não preparado a que se põe tutor e forte adubo; isso é o diálogo entre o jardineiro e o feijão; outra ideia havemos de fazer das possibilidades do homem e do arranjo da vida; que a criança se não deixe nunca de ver como elemento activo na máquina do mundo e de reconhecer que a comunidade está aproveitando o seu trabalho; de número na classe e de fixador de noções temos de a passar a cidadão. 
O grande educador não pensa na escola pela escola, como o grande artista não aceita a arte pela arte; é incapaz de se encerrar na relativa estreiteza de uma vida de ensino; a escola, de tudo o que lhe oferecia o universo, é apenas o ponto a que dedicou maior interesse; mas é-lhe impossível furtar-se a mais larga actividade. De outro modo: trabalha com ideias gerais; não dirá que esta escola é o seu mundo, mas que esta escola é parte indispensável do seu mundo. E quererá também que toda a oficina passe a ser uma escola; que haja o trabalho proporcionado e alegre, amorosamente feito, porque se sabe necessário ao progresso, levado a cabo numa atitude de artista e de voluntário, disciplinado remador na jangada comum; que se não esmaguem as faculdades superiores do operário sob o peso e a monotonia de tarefas sem interesse e sem vida; que se faça a clara distinção entre o homem e a máquina; que, finalmente, se ajude o trabalhador a encontrar na sua ocupação, em todas as ideias que a cercam e a condicionam ou que ela própria provoca, o Bem Supremo da sua vida e da vida dos outros. 
Agostinho da Silva, in 'Considerações'

FRANK SINATRA - Love's been good to me - 1969

Washington Winds- Eiger: Journey to the Summit

Vesuvius. Frank Ticheli.

Os Convencidos da Vida



Todos os dias os encontro. Evito-os. Às vezes sou obrigado a escutá-los, a dialogar com eles. Já não me confrangem. Contam-me vitórias. Querem vencer, querem, convencidos, convencer. Vençam lá, à vontade. Sobretudo, vençam sem me chatear.
Mas também os aturo por escrito. No livro, no jornal. Romancistas, poetas, ensaístas, críticos (de cinema, meu Deus, de cinema!). Será que voltaram os polígrafos? Voltaram, pois, e em força.
Convencidos da vida há-os, afinal, por toda a parte, em todos (e por todos) os meios. Eles estão convictos da sua excelência, da excelência das suas obras e manobras (as obras justificam as manobras), de que podem ser, se ainda não são, os melhores, os mais em vista.
Praticam, uns com os outros, nada de genuinamente indecente: apenas um espelhismo lisonjeador. Além de espectadores, o convencido precisa de irmãos-em-convencimento. Isolado, através de quem poderia continuar a convencer-se, a propagar-se?
(...) No corre-que-corre, o convencido da vida não é um vaidoso à toa. Ele é o vaidoso que quer extrair da sua vaidade, que nunca é gratuita, todo o rendimento possível. Nos negócios, na política, no jornalismo, nas letras, nas artes. É tão capaz de aceitar uma condecoração como de rejeitá-la. Depende do que, na circunstância, ele julgar que lhe será mais útil.
Para quem o sabe observar, para quem tem a pachorra de lhe seguir a trajectória, o convencido da vida farta-se de cometer «gaffes». Não importa: o caminho é em frente e para cima. A pior das «gaffes», além daquelas, apenas formais, que decorrem da sua ignorância de certos sinais ou etiquetas de casta, de classe, e que o inculcam como um arrivista, um «parvenu», a pior das «gaffes» é o convencido da vida julgar-se mais hábil manobrador do que qualquer outro.
Daí que não seja tão raro como isso ver um convencido da vida fazer plof e descer, liquidado, para as profundas. Se tiver raça, pôr-se-á, imediatamente, a «refaire surface». Cá chegado, ei-lo a retomar, metamorfoseado ou não, o seu propósito de se convencer da vida - da sua, claro - para de novo ser, com toda a plenitude, o convencido da vida que, afinal... sempre foi.

Alexandre O'Neill, in "Uma Coisa em Forma de Assim"

segunda-feira, 4 de outubro de 2010

quinta-feira, 30 de setembro de 2010

quinta-feira, 23 de setembro de 2010

domingo, 19 de setembro de 2010

Aladdin - Puerto Rico Symphonic orquestra

Naquela linda manhã

Marcha Radetzky - Concierto año nuevo 2009 (Daniel Barenboim)

Idade Subjectiva

O professor perguntou ao menino Carlinhos:

— Se ambos os teus pais tivessem nascido em 1958, que idade dizias que eles tinham?

— Dependia...

— Dependia de quê?

— De perguntarmos ao meu pai ou à minha mãe...

Não Diga o Meu Espelho que Envelheço

Não diga o meu espelho que envelheço,

se a juventude e tu têm igual data,

mas se os sulcos do tempo em ti conheço

então devo expiar no que me mata.

Tanta beleza te recobre e deu

tais galas a vestir a meu coração,

que vive no teu peito e o teu no meu.

Mais velho do que tu serei então?

Portanto, meu amor, cuida de ti

como eu, não por mim, por ti somente

te cuido o coração, que guardo aqui

como à criança a ama diligente.

Não contes com o teu se o meu morrer.

Deste-me o teu e o não vou devolver.



William Shakespeare, in "Sonetos (22)"

É por ter Espírito que me Aborreço

É preciso esconjurar, da forma que nos for possível, este diabo de vida que não sei porque é que nos foi dada e que se torna tão facilmente amarga se não opusermos ao tédio e aos aborrecimentos uma vontade de ferro. É preciso, numa palavra, agitar este corpo e este espírito que se delapidam um ao outro na estagnação e numa indolência que se confunde com um torpor. É preciso passar, necessariamente, do descanso ao trabalho - e reciprocamente: só assim estes parecerão, ao mesmo tempo, agradáveis e salutares. Um desgraçado que trabalhe sem cessar, sob o peso de tarefas inadiáveis, deve ser, sem dúvida, extremamente infeliz, mas um indivíduo que não faça mais do que divertir-se não encontrará nas suas distracções nem prazer nem tranquilidade; sente que luta contra o tédio e que este o prende pelos cabelos - como se fosse um fantasma que se colocasse sempre por detrás de cada distracção e espreitasse por cima do nosso ombro.


Não julgue, cara amiga, que eu só porque trabalho regularmente estou isento das investidas deste terrível inimigo; penso que, quando se tem uma certa disposição de espírito, é preciso termos uma imensa energia de forma a não nos deixarmos absorver e conseguir escapar, graças à nossa força de vontade, à melancolia em que caímos continuamente. O prazer que sinto, neste momento, em dialogar consigo acerca deste sentimento é mais uma prova de como eu me procuro agarrar, avidamente, sempre que tenho forças para isso, a todas as oportunidades para ocupar o espírito (ainda que seja referindo-me a este tédio, que procuro combater).


Sempre pensei que havia tempo a mais. Atribuo em grande parte este sentimento ao prazer que quase sempre encontrei no próprio trabalho: os verdadeiros ou pretensos prazeres que se lhe sucediam não contrastavam talvez muito com a fadiga que me comunicava o trabalho - fadiga que a maior parte dos homens sente duramente. Não tenho dificuldade em imaginar o prazer que deve sentir nas suas horas de repouso essa multidão de homens que vemos vergados sob trabalhos desencorajadores - e não me refiro apenas aos pobres, que têm de ganhar o seu pão quotidiano, mas também aos advogados, aos funcionários, submersos pela papelada e ocupados com encargos fastidiosos ou que não lhe dizem respeito.


No entanto, também é verdade que a maior parte desses indivíduos não têm problemas com a imaginação e vêem nas suas ocupações maquinais uma maneira como qualquer outra de ocupar o tempo. E serão tanto menos infelizes quanto mais medíocres forem. Para me consolar, termino com este último axioma: que é por ter espírito que me aborreço.


Eugène Delacroix, in 'Diário'

quinta-feira, 16 de setembro de 2010

O Leão

O Elefante

Pobre Velha Música!

Pobre velha música!

Não sei por que agrado,

Enche-se de lágrimas

Meu olhar parado.



Recordo outro ouvir-te,

Não sei se te ouvi

Nessa minha infância

Que me lembra em ti.



Com que ânsia tão raiva

Quero aquele outrora!

E eu era feliz? Não sei:

Fui-o outrora agora.



Fernando Pessoa, in "Cancioneiro"

A Necessidade de Ser Insultado

Com que frequência caminhei no quarto de um lado para o outro, com o desejo inconsciente que alguém me insultasse ou proferisse alguma palavra que eu pudesse interpretar como um insulto, para que eu desabafasse a minha raiva em alguém.

É uma experiência muito simples que acontece quase diáriamente, e ainda para mais quando existe algum outro segredo, uma aflição no coração, para o qual se deseja dar uma expressão verbal mas que não se consegue.



Fiodor Dostoievski, in 'Humilhados e Ofendidos'

terça-feira, 14 de setembro de 2010

Mensagem a Alunos e Professores

A arte mais importante do professor é a de despertar a alegria pelo trabalho e pelo conhecimento.

«Queridos estudantes!

Regozijo-me por vos ver hoje diante de mim, alegre juventude de um país abençoado.

Lembrai-vos de que as coisas maravilhosas que ireis aprender nas vossas escolas são a obra de muitas gerações, levada a cabo por todos os países do mundo, à custa de muito entusiasmo, muito esforço e muita dor. Tudo é depositado nas vossas mãos, como uma herança, para que a aceitem, honrem, desenvolvam e a transmitam fielmente um dia aos vossos filhos. Assim nós, embora mortais, somos imortais nas obras duradouras que criamos em comum.

Se tiverem esta ideia sempre em mente, encontrarão algum sentido na vida e no trabalho e poderão formar uma opinião justa em relação aos outros povos e aos outros tempos.»



Albert Einstein, in 'Como Vejo o Mundo'

Acaso

No acaso da rua o acaso da rapariga loira.

Mas não, não é aquela.



A outra era noutra rua, noutra cidade, e eu era outro.

Perco-me subitamente da visão imediata,

Estou outra vez na outra cidade, na outra rua,

E a outra rapariga passa.



Que grande vantagem o recordar intransigentemente!

Agora tenho pena de nunca mais ter visto a outra rapariga,

E tenho pena de afinal nem sequer ter olhado para esta.



Que grande vantagem trazer a alma virada do avesso!

Ao menos escrevem-se versos.

Escrevem-se versos, passa-se por doido, e depois por gênio, se calhar,

Se calhar, ou até sem calhar,

Maravilha das celebridades!



Ia eu dizendo que ao menos escrevem-se versos...

Mas isto era a respeito de uma rapariga,

De uma rapariga loira,

Mas qual delas?

Havia uma que vi há muito tempo numa outra cidade,

Numa outra espécie de rua;

E houve esta que vi há muito tempo numa outra cidade

Numa outra espécie de rua;

Por que todas as recordações são a mesma recordação,

Tudo que foi é a mesma morte,

Ontem, hoje, quem sabe se até amanhã?



Um transeunte olha para mim com uma estranheza ocasional.

Estaria eu a fazer versos em gestos e caretas?

Pode ser... A rapariga loira?

É a mesma afinal...

Tudo é o mesmo afinal ...



Só eu, de qualquer modo, não sou o mesmo, e isto é o mesmo também afinal.



Álvaro de Campos, in "Poemas"

Horward Shore - Concerning Hobbits

The Lord of the Rings: Symphony - The Grey Havens

Caetano Veloso Cucurrucucu Paloma Hable Con Ella

Gioacchino Rossini - Il barbiere di Siviglia

Tim & Rui Veloso - Voar

cavalleria rusticana ouverture

Cavalaria Ligeira (Von Suppé)

segunda-feira, 13 de setembro de 2010

domingo, 12 de setembro de 2010

O Grande Engano da Mediocridade

O grande engano da mediocridade! Este é um alerta para os nossos dias. O fácil, o imediato, o que dá para todos, o que passa por democrático, o que está 'benzinho' e mediano, parece, tantas vezes, a solução. Não fazer ondas, ceder, ir pelo mais ou menos, vale tudo desde que não chegue cá o incómodo: este é o retrato dos desiludidos! Nivelar por baixo não é caminho, é engano.



(Padre) Vasco Pinto de Magalhães, in 'Não Há Soluções, Há Caminhos'

Miseria Occulta

Bate nos vidros a aurora,

Vem depois a noute escura;

E o pobre astro que ali móra,

Não abandona a costura!



Para uns a vida é d'abrolhos!

Para outros mouta de lyrios!

Bem o revelam seus olhos,

Pisados pelos martyrios!



Miseria afugenta tudo!

Miseria tem dons funestos!

Quem é que gaba o velludo

D'aquelles olhos honestos!...



Ninguem seus olhos brilhantes

Descobre n'essas alturas...

E aquellas formas tão puras,

E aquellas mãos elegantes!



Sempre á costura inclinada!

Morra o sol ou surja a lua

Nunca vi descer á rua

Aquella loura encantada!



Aquelle lyrio dobrado

Por que assim vive escondido!

Eu bem sei!--não tem calçado!

E é muito usado o vestido!



Por isso não tem porvir

Morrerá virgem e nova,

E aguarda-a bem cedo a cova...

Que eu bem a ouço tossir!



Miseria afugenta tudo!

Miseria tem dons funestos!

Quem é que gaba o veludo

D'aquelles olhos honestos!



Pobre flor desfalecida

Tão nova e ainda em botão!

Como teve estreita a vida,

Terá estreito o caixão!



António Gomes Leal, in 'Claridades do Sul'

Pacis Valley, Haemhouts (Montemorense)

sexta-feira, 10 de setembro de 2010

Rubén Simeó y Giuliano Sommerhalder. Vivaldi 1º. Alemania

Intermedio. La boda de Luís Alonso. J Gimenez. Lucero Tena

Pat Metheny - Nuovo Cinema Paradiso (Ennio Morricone) - Jazz in Marciac

John Mayer - Heart of Life (Acoustic)

Hector Berlioz: Hungarian March

Les Miserables - Stars

The Original London Cast of Les Miserables - The Reunion!

As Canções dos Miudos - Bom dia vou para a escola

Desporto e Pedagogia

I



Diz ele que não sei ler

Isso que tem? Cá na aldeia

Não se arranjam dúzia e meia

Que saibam ler e escrever.



II



P'ra escolas não há bairrismo,

Não há amor nem dinheiro.

Por quê? Porque estão primeiro

O Futebol e o Ciclismo!



III



Desporto e pedagogia

Se os juntassem, como irmãos,

Esse conjunto daria,

Verdadeiros cidadãos!

Assim, sem darem as mãos,

O que um faz, outro atrofia.



IV



Da educação desportiva,

Que nos prepara p'ra vida,

Fizeram luta renhida

Sem nada de educativa.



V



E o povo, espectador em altos gritos,

Provoca, gesticula, a direito e torto,

Crendo assim defender seus favoritos

Sem lhe importar saber o que é desporto.



VI



Interessa é ganhar de qualquer maneira.

Enquanto em campo o dever se atropela,

Faz-se outro jogo lá na bilheiteira,

Que enche os bolsinhos aos que vivem dela.



VII



Convém manter o Zé bem distraído

Enquanto ele se entrega à diversão,

Não pode ver por quantos é comido

E nem se importa que o comam, ou não.



VIII



E assim os ratos vão roendo o queijo

E o Zé, sem ver que é palerma, que é bruto,

De vez em quando solta o seu bocejo,

Sem ter p'ra ceia nem pão, nem conduto.



António Aleixo, in "Este Livro que Vos Deixo..."

Escola

"A escola não deve ter a melancolia da cadeia. Pestallozi, Froebel, os grandes educadores, ensinavam em pátios, ao ar livre, entre árvores. Froebel fazia alterar o estudo do ABC e o trabalho manual; a criança soletrava e cavava. A educação deve ser dada com higiene. A escola entre nós é uma grilheta do abecedário, escura e suja: as crianças, enfastiadas, repetem a lição, sem vontade, sem inteligência, sem estímulo: o professor domina pela palmatória, e põe todo o tédio da sua vida na rotina do seu ensino."


 "Uma Campanha Alegre"

 Queiroz , Eça